domingo, 8 de setembro de 2013

Mais um dia de lutas

A situação está insustentável. Já não se pode ir às ruas, entoar palavras de ordens ou empunhar faixas que falem sobre nossas justas reivindicações. Há helicóptero sobre nossas cabeças. Há tropas e mais tropas à nossa frente e nas laterais. Não existe diálogo, nem vontade nenhuma de fazê-lo. Decerto, nunca existiu. Os governos não investem em saúde, transporte ou educação, mas equipam muito bem seus homens para garantir uma forte repressão a nós que nada mais temos além dos nossos sonhos e nossa disposição. É o estampido das bombas, o gosto do gás que fica na boca, o ardor da pimenta que salta aos olhos e a cena dos que ficaram caídos, feridos no chão. São também as lembranças dos que correram à procura de abrigo, das mãos geladas da companheira de outra sigla que chama teu nome, e do reencontro entre os nossos camaradas em meio àquela imensa confusão. Vivemos um novo momento: mais pessoas questionam, contestam, resistem. É preciso seguir nas ruas. Mas é preciso sobretudo fortalecer ferramentas que apontem para além dessas mobilizações, que nos fortaleça organizativamente, porque os que nos combatem, já deram inúmeras mostras, estão bastante bem organizados.

Reflexões pós 7 de setembro, em Fortaleza - CE.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Sobre o que arde mais


Ardem os olhos sob efeito das bombas de gás lacrimogêneo jogadas pelo estado repressor e, tanto quanto eles, ardem também os nossos rostos diante do conservadorismo e tantas incompreensões. Exigir que não se manifestem agora aqueles que estiveram encampando uma série de lutas enquanto uma multidão estava adormecida, faz parte tanto de um grande jogo político da direita, como de uma imensa contradição da democracia tão reivindicada por aquelas e aqueles mais honestos.

Ontem, na manifestação que levou dezenas de milhares às ruas de Fortaleza, enquanto a marcha era alvejada pela polícia militar com bombas e balas de borracha, havia um setor que dividia o movimento e incitava um grito de “fora partido”. Não somente nós do PSTU fomos obrigados a retirar nossas bandeiras para participar da marcha, centrais sindicais como a CSP Conlutas, entidades estudantis como a ANEL e movimentos sociais como o MST foram também impedidos de fazer o que há muito é parte do seu dia a dia.

Fomos xingados, ameaçados por força física, cercados por uma multidão. Compreendemos toda a descrença das brasileiras e brasileiros em relação à política partidária, sobretudo após toda traição petista ao longo de dez anos no governo. Mesmo assim, permanecemos firmes na marcha e firmes seguimos orgulhosos em mostrar nossa política e nossa organização. Nos organizamos, debatemos, militamos diariamente. Deixar de ir às ruas agora seria negar toda a história que a gente constrói cotidianamente.

Podem fazer arder os nossos olhos, os nossos rostos, podem até ligeiramente nos entristecer, mas, diante da nossa necessidade e do desejo ardente de transformar realmente as coisas, tudo isso acaba que nos fortalece e nos faz perceber o quão grande é o tamanho e quão ousada é a nossa tarefa. “Calo-me, espero, decifro. / As coisas talvez melhorem. / São tão fortes as coisas! Mas eu não sou as coisas e me revolto.” (Carlos Drummond, em É tempo de partido).

domingo, 16 de junho de 2013

R$ 560,00


Acho graça da Fortaleza Apavorada que diz que não vai às ruas na próxima quarta-feira, quando acontecerá jogo do Brasil contra o México, justificando que a melhor forma de protestar contra os absurdos que acontecem neste país é indo vestido de preto à arena Castelão.

Na última semana, várias capitais do país explodiram em mobilizações que levaram às ruas milhares de jovens e trabalhadores, inicialmente debatendo a pauta do transporte público e de seus altos preços, mas ganhando proporções distintas e expulsando da garganta gritos de indignação que estavam há muito presos.

O valor cobrado por um ingresso para assistir a este jogo da Copa das Confederações em Fortaleza é quase o dobro do valor necessário para que um fortalezense possa comprar uma cesta básica, é mais de 80% do salário mínimo que se recebe após um mês inteiro de intenso trabalho.

Somos nós, os jovens e trabalhadores que não temos e que por isso não pagamos, os que mais sofremos com a falta de segurança que, quando não nos toma de assalto, nos espanca, nos detém, nos prende ou mesmo nos mata porque nos entende como inimigos.

É legítimo reivindicar segurança pública e protestar contra a violência, mas não questionar as causas desses problemas e a relação entre tudo isso e os governos é no mínimo inconsequente. Por isso é importante que se diga que entre nós há diferenças.

Diferente da Fortaleza Apavorada, nós – que também gostaríamos de assistir a Copa de perto – famílias removidas, trabalhadores em campanha salarial, estudantes sem carteirinha e sem direito à meia cultural, não estaremos de preto quarta-feira na arena Castelão, mas nas ruas, onde as lutas se darão.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Agenda setting


Serenata de amor foi a sobremesa de hoje no restaurante universitário. Sentei ao lado de uma moça que mostrava à amiga sorridente uma mensagem no celular. Em seguida, dizia contente: "Quer dizer, mulher, que eu estou namorando e nem sei?". 

Um pouco mais ao lado, um senhor contava saudoso a história de uma namorada que teve em sua juventude. Ao mesmo tempo em que comia sua laranja, lamentava o fato de a senhora do RU ter-lhe negado um chocolate. "Só dou para as meninas!", imitava ele repetidas vezes. 

Observei nas outras mesas que outros rapazes tinham chocolate em suas bandejas. "Talvez tivesse acabado", pensei. Ou talvez quisesse a senhora provocar qualquer cascaria só para poder chamar a atenção daquele senhor e assim esquecer qualquer solidão que ela sentia.

Talvez tudo isso, talvez nada disso, mas o fato era que, dos que mais queriam aos que não queriam, esqueciam todas de tudo e falavam todos do mesmo tema.

- Feliz dia dos namorados.
- Pra mim? Menino, não está fácil pra ninguém.
- É verdade mesmo. Com o governo Dilma, então...

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Decepção e satisfação do dia

Sabes, camarada, contigo eu aprendi esse negócio interessante de eleger episódios para falar do dia. No começo fui pega de surpresa. Achei difícil. Confesso. Mas hoje, de repente, fluiu que foi uma beleza! Aconteceu que depois de todo esse tempo parada dados tantos balanços e comemorações, desejei muito poder voltar para a natação. Aguardei do auge de uma ansiedade danada, feito menino que depois do período de férias não espera outra coisa da vida senão voltar à escola. Já estava eu naquele maiô pretinho básico, e qual não foi minha decepção ao descobrir que havia perdido minha touca e meus óculos. Mas não pode ser! Daí bateu uma tristeza das grandes. Sabes quando o sujeito já vai fragilizado? Pois então. Revirei o quarto inteiro, refleti sobre todas as possibilidades e quando já quase desistia pensei que um lugar provável para tê-los perdido era lá mesmo onde faço as tais aulas de natação. Saí de casa às pressas e peguei o primeiro ônibus lotado. Fui o caminho inteirinho pensando positivamente. Até promessa para São Longuinho eu fiz! Juro. Então cheguei. Passei o cartão e fui entrando. Nem quis olhar para a piscina, para não aumentar a vontade. Virei à esquerda, entrei na sala. Aguardei uma moça que fazia matrícula e muitas perguntas sobre como seria o seu primeiro dia. Depois dei boa tarde a ela e à senhora e fui falando tudinho. Olha, touca colorida eu não vi por aqui, não. Mas posso procurar. E o sorriso já foi se abrindo, porque era ela. E os óculos, precisa ver se encontra aqui nessa caixa (com mil outros). É esse aqui! É esse aqui! É esse aqui! Muito obrigada, senhora. Seja bem-vinda, moça. E quanto ao cabelo, não te preocupas, se fizeres massagem uma vez por semana fica tudo bem. E saí de lá sorridente, e olhei para trás, e dei três pulinhos, e fui para a piscina contar para a professora aquilo que era, diante de algo tão pequeno, minha imensa satisfação.
*Para Juliana Mota
 
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