Querido Flávio Paiva,
Há algum tempo, li a reflexão de uma amiga – hoje jornalista – que, entre outras coisas, falava sobre como a História carece de uma narração jornalística. Fiz dessa afirmação a chave para o entendimento de toda minha dificuldade juvenil em compreender os episódios tidos como dignos de fazer parte da História. Talvez por isso me animem tanto os livros escritos por jornalistas. Foi assim meu encontro com uma trilogia sobre mitologia Grega, publicado pela Super Interessante e, mais recentemente, com Ciço na guerra dos rebeldes, de tua autoria e ilustrações de Angelo Abu.
Nestes três poucos anos em que vivo no Ceará, pude ouvir algumas muitas histórias. O fato foi que algumas delas roubaram muito mais de minha atenção que outras. Interessava-me saber mais do por que Padre Cícero era considerado uma figura controversa e, principalmente, sobre essa sua relação tão estreita com o famoso Lampião, de sobrenome Ferreira, feito eu. Só não busquei mais relatos por conta daquele meu pé atrás com as leituras sobre memórias históricas. Foi quando, de repente, soube do lançamento de teu livro.
Ciço na guerra dos rebeldes me fez passear por um universo um tanto quanto desconhecido. Juazeiro, onde vivem ou de onde vieram alguns de meus grandes camaradas, jamais imaginei ter sido um dia considerada terra de gente desacreditada, refúgio dos náufragos da vida. Não sabia também que o batalhão organizado por Cícero era para lutar contra os ditos comunistas. Pensando cá com os meus botões, eu era que não iria querer ter a má sorte de ter que lutar contra um exército abençoado por aquele “padim”!
As ilustrações deram ainda mais vida a uma leitura que já seguia leve e trazia muito de História ao meu cotidiano. Passaram a fazer mais sentido, por exemplo, as fotografias que por vezes vi em exposição na entrada da sala de cinema da Casa Amarela: um Lampião com sua Maria tão Bonita e até sua cachorra Baleia! Cena cotidiana do cangaço. Fiquei pensando nele como poeta e bordador, assim como fiquei também pensando no Ciço, mais que personalidade histórica, uma figura insurgente e cheia de contradição. Bem como tu disseste naquela dedicatória.
Um dia desses ainda vou a Juazeiro, mas enquanto fico por aqui, te agradeço por essa viagem. Um abraço imenso e até as próximas leituras.
Camila Chaves
Fortaleza, 21 de abril de 2014.
3 comentários:
Ei, Camila, seus comentários enriquecem o sentido do livro e do mito que o inspirou. Sua voz me fez lembrar de Roland Barthes, quando ele diz que um mito é tudo que está suscetível de ser julgado por um discurso. E o CIÇO é um caso evidente de figura aberta às mais distintas apropriações. Agradecido, minha cara. Bj. Flávio Paiva.
É incrível como seus textos são gostosos de ler... Li sua carta à suas amigas formigas, e achei curioso.
Carliane, depois de tanto tempo sem escrever, teu comentário me fez lembrar os bons tempos de produção de texto por essas bandas daqui. Chega deu uma alegria! Quanto à carta às danadas das formigas, essa é uma pequena curiosidade que, junto com outras tantas, enchem toda uma vida. Um beijo e até as próximas leituras.
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