Ardem os olhos sob efeito das bombas de gás lacrimogêneo jogadas pelo estado repressor e, tanto quanto eles, ardem também os nossos rostos diante do conservadorismo e tantas incompreensões. Exigir que não se manifestem agora aqueles que estiveram encampando uma série de lutas enquanto uma multidão estava adormecida, faz parte tanto de um grande jogo político da direita, como de uma imensa contradição da democracia tão reivindicada por aquelas e aqueles mais honestos.
Ontem, na manifestação que levou dezenas de milhares às ruas de Fortaleza, enquanto a marcha era alvejada pela polícia militar com bombas e balas de borracha, havia um setor que dividia o movimento e incitava um grito de “fora partido”. Não somente nós do PSTU fomos obrigados a retirar nossas bandeiras para participar da marcha, centrais sindicais como a CSP Conlutas, entidades estudantis como a ANEL e movimentos sociais como o MST foram também impedidos de fazer o que há muito é parte do seu dia a dia.
Fomos xingados, ameaçados por força física, cercados por uma multidão. Compreendemos toda a descrença das brasileiras e brasileiros em relação à política partidária, sobretudo após toda traição petista ao longo de dez anos no governo. Mesmo assim, permanecemos firmes na marcha e firmes seguimos orgulhosos em mostrar nossa política e nossa organização. Nos organizamos, debatemos, militamos diariamente. Deixar de ir às ruas agora seria negar toda a história que a gente constrói cotidianamente.
Podem fazer arder os nossos olhos, os nossos rostos, podem até ligeiramente nos entristecer, mas, diante da nossa necessidade e do desejo ardente de transformar realmente as coisas, tudo isso acaba que nos fortalece e nos faz perceber o quão grande é o tamanho e quão ousada é a nossa tarefa. “Calo-me, espero, decifro. / As coisas talvez melhorem. / São tão fortes as coisas! Mas eu não sou as coisas e me revolto.” (Carlos Drummond, em É tempo de partido).