domingo, 26 de setembro de 2010

O pitel do Integração

E os primeiros relatos sobre a maravilhosa arte de especular.

Enquanto estudantes e trabalhadores punham o fim de mais um daqueles cansativos dias da semana ao sabor de seu corre-corre e teciam, a seus próprios modos, toda a vida daquele Terminal de Integração à beira da Praia Grande, nas televisões das casas do país inteiro aquele jornalista voltava a aparecer, tal como acontece ano após ano, para anunciar e convidar às inscrições os que sonham em participar daquele verdadeiro picadeiro de uma suposta vida real.

Suposta porque a vida real mesmo está em lugares como os Terminais de Integração. Estes são de passagens, de chegadas, de partidas, de despedidas e, principalmente, de permanência daqueles que vivem com a falta de oportunidades e que fazem a diferença surgir, contraditoriamente, em meio aquilo que é organizado para ser do mesmo jeito todos os dias. E assim ela surgia, com todas aquelas gostosuras de bombons e um punhado daquele jornal que eu odeio com todas as minhas forças.

Em meio aquele verdadeiro frenesi, estava ela agindo naturalmente enquanto parecia desafiar toda a cara que a gente que se mete a militante e cientista social bem sabe que a pobreza tem. A mim, que de fato perco mais tempo esperando um ônibus que às vezes nem passa do que no trajeto feito pelo dito cujo até a avenida mais próxima de casa, só restava fazer bom uso do tempo para observar e especular. E assim, a primeira hipótese se fazia e era aquela que dizia que tudo aquilo não passava de uma grande esperteza!

O plano era perfeito, porque beleza ela já tinha e a popularidade ela construía ao passo que sua identidade de vendedora de bombons ia sendo fortalecida. Porém, embora tivesse tudo para dar certo, minha primeira hipótese caía por terra com a mesma velocidade como ela surgira. O programa estreou, gerou polêmicas e principalmente muito dinheiro a seus patrocinadores, mas não houve por lá ninguém que tomasse para si a identidade de uma vendedora de bombons. Era uma especulação falha, mas o começo para muitas outras.

Ela: dona da voz que eu jamais ouvira, não era muda porque passava horas falando ao celular; não tinha como ser de família rica porque vendia bombons em companhia de sua mãe; não deveria morar em um bairro nobre porque seus amigos eram todos da periferia; e deveria ter feito inconscientemente aquela escolha sobre preferir dar bola às menininhas a qualquer cara idiota feito eu, hipótese esta mantida mesmo quando mais tarde eu descobriria que uma de suas supostas paqueras era na verdade a sua irmã.

Entre especulações, idas, vindas e principalmente, batalhas da vida, o pitel do Integração ia sendo construído nesse divertido quebra-cabeças de detalhes, nesta verdadeira arte de buscar sentidos em meio às histórias que cada pessoa carrega consigo, mesmo quando não sabe.

domingo, 19 de setembro de 2010

A pergunta que não fiz

Enquanto o Maranhão apresenta um dos maiores índices de mortalidade infantil e os piores índices de educação do país, existe um governo que insiste, tanto em nível nacional, como estadual, em anunciar que a condição de vida do maranhense nunca esteve tão bem e que o que se deveria mesmo fazer era respirar a brisa de uma suposta tranquilidade ou, quem sabe até, comemorar.

Fala-se, com muito entusiasmo, da ampliação do acesso ao ensino superior, atribuindo-se toda honra a programas como o Prouni e o Reuni, furtando-se, porém, de deixar claro à sociedade que, no primeiro caso, a verba utilizada para o pagamento de vagas nas faculdades particulares é a mesma que falta na universidade pública e que impede que o direito à educação pública e gratuita seja garantido a todas as pessoas, sem a perda da qualidade.

Fala-se em ampliação do acesso ao ensino superior sem se debater a necessidade de implementação de políticas de ações afirmativas que garantam que adolescentes e jovens, sobretudo negros e pobres residentes em nossas periferias, tenham não somente acesso, mas sobretudo condições objetivas de permanência na universidade, não precisando abrir mão de sua formação sob pena de sua própria sobrevivência.

No caso do Reuni, em especial, o que pudemos observar foi que a implementação deste programa ocorreu de forma impositiva, sem respeito a autonomia da universidade e, o que foi ainda mais grave, sem o mínimo de debate com a comunidade acadêmica e a sociedade em geral, e uma, entre tantas provas deste fato, foi a mais recente adesão ao Enem como única forma de ingresso à universidade federal, o que tem causado muito descontentamento.

Nesse sentido, gostaria de perguntar aos presentes candidatos, sobretudo aos que não expressaram aqui e nem nunca expressarão em seus projetos de governo a necessidade e, principalmente, uma vontade real de transformação social, até quando nós, adolescentes e jovens, pegaremos carona na implementação de políticas públicas que nos dizem respeito, sem que nosso protagonismo e nossa capacidade de debate e organização sejam, de fato, considerados.

*Intervenção elaborada por mim durante a audiência pública realizada na última quarta-feira (15) com os candidatos ao governo do estado para assinatura do termo de compromisso pelos direitos da infância e adolescência. Marcos Silva (Pstu), Saulo Arcangeli (PSol), Flávio Dino (PC do B) e, mais tarde, Josivaldo Corrêa (PCB), fizeram-se presentes, enquanto Jackson Lago (PDT) foi representado por sua esposa, Clay Lago, e Roseana Sarney (PMDB) por seu vice, Washington Luís (PT).

Importante destacar que a ausência da candidata e atual governadora do Maranhão não nos foi nenhuma grande surpresa, uma vez que há tempos a não participação em debates já havia sido anunciada. Atribuido a este e, entre tantos outros fatores, ao grande número de adolescentes que manifestou vontade de expressar suas inquietudes na ocasião, optei por compartilhar em outro momento a pergunta que eu muito queria, mas que infelizmente não fiz.

domingo, 12 de setembro de 2010

Fragmentos de uma carta já postada

Bom dia.

Porque amor é sol. É calor. É praia. É banho de sal da água do mar ou do chuveiro. É voltar para casa com o cheiro do teu shampoo em meus cabelos. É chorar na despedida por não conseguir dizer tudo o que queria dizer. É ter medo de não te encontrar de novo para ficar até o dia amanhecer.

É esquecer a fome e só depois de muito dela lembrar. Porque o amor para mim é uma mesa para dois, seja de café, almoço ou jantar. É hambúrguer, batata frita e suco de laranja dentro do cinema. É pizza com guaraná Jesus na praça de alimentação. É rabanada com pipoca dentro do teu quarto, em frente à tua televisão.

Amor para mim é sofrer por saber quanto espaço ocupo quando entro em tua casa, teu quarto e teu banheiro. São minhas roupas espalhadas, são meus produtos de beleza. É o pote de creme derrubado no chão do box. É o meu cheiro te fazendo lembrar e minha preocupação para lá nenhum objeto deixar.

É voltar para casa com um nó na garganta por não saber se tu ficaste bem. É deixar de lado toda a alegria que eu tinha em viajar se eu não for para aí te ver. Porque estar contigo é mesmo bom. Te ver, te ouvir, segurar tua mão tão bonita, te abraçar e sentir teu cheiro de calma, de madrugada, te beijar e sentir teu gosto de amor.

O amor é tudo isso. É diferença. É coincidência. O amor sou eu. O amor és tu. Quem o inventou, não sei. Só sei que estou longe da tua alegria e que ficar perto de ti é guardar estas lembranças como uma das coisas mais valiosas que tenho.

E se do nosso amor a gente é quem sabe, quem em meu nome dirá que é de paz que preciso quando o amor que guardarei por toda minha vida carrega consigo o nome da guerra?

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Voltar à terra é preciso

A fuga dos domingos para uma manhã de quarta-feira vem para expressar a necessidade nossa de voltar à terra. Voltar à terra é preciso porque ela, chão, piso ou palco das mais variadas manifestações, é elemento presente de nossa história e de nossa organização em sociedade, porque ela, se entendida como natureza, constitui-se fonte dos valores de uso e de nossa própria vida.

Voltar à terra é preciso porque nela toda produção material ou simbólica se organiza, porque ela concentrada reduz a poucos não somente a riqueza expressa na economia, mas em todos os outros direitos não garantidos, como a cultura, a igualdade, a moradia, a formação, a organização e, principalmente, a participação, o reconhecimento, e mesmo a vida em liberdade.

Por isso, o direito à terra deve ser garantido a todos nós. Nós, os expropriados do planeta; nós, os exilados das sementes; nós, os apartados dos frutos; os operários sem fábrica, os camponeses sem chão, como nos dizeres de Mauro Iasi ou de Milton Santos ao expressar a terra como “teatro obrigatório da ação”, como o meio onde a existência humana é tornada possível.

É então por entender que sem terra somos todos nós, que faço destas palavras um convite ao voto pelo “sim” durante o plebiscito popular pelo limite da propriedade da terra que tem início neste dia 1º e segue até 7 de setembro em todo país. Informa-te sobre os pontos de votação e sobre esta grande campanha que expressa uma luta ainda maior, como o tamanho da precisão daquilo que nos é necessidade.
 
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