domingo, 22 de agosto de 2010

É tempo de partido

Quando chegar o tempo em que eu puser-me a falar de partido, haverá quem pergunte se falo do coração.

Responderei então, com o mesmo tom tranquilo que minha voz costuma ter, que sim. Falo do coração, porque afinal, falo de lutas, falo de sentimentos e falo, principalmente, de necessidades reais que eu e minha classe temos cotidianamente. E falar do coração deve ser motivo de orgulho porque pulsam em nossas veias as cores da revolução quando são de amor os sentimentos que nos movem.

Ao longo de uma estrada que me pus a trilhar nos últimos cinco anos, experienciar novas relações como a construção de um coletivo, a militância no movimento estudantil e as caminhadas junto aos movimentos sociais, fizeram-me vislumbrar a transformação e a vitória como possibilidades e a luta e a organização como necessidades.

E quando organizar-se faz-se necessidade e a consciência avança para níveis bastante distantes de onde um dia esteve, reconhece-se a importância de sair em defesa de um sistema de reivindicações transitórias entendendo que estas fazem parte da construção de um projeto mais amplo de sociedade.

Assim, encontrei um partido que defende um programa socialista para a educação, a saúde, a moradia, que trata a destruição ambiental e as opressões de machismo, racismo e homofobia como questões a serem combatidas, que fala sobre a necessidade de redução da jornada de trabalho e que entende a juventude e os trabalhadores como protagonistas no processo de transformação.

Encontrei-me em um espaço onde a solidão para atuar não mais há porque companheiras e companheiros fizeram-se camaradas, porque os vazios fizeram-se presenças e as necessidades de formação e de atuação vêm sendo supridas dia após dia em companhia daqueles que têm o centralismo democrático como sinônimo de confiança, disciplina e, sobretudo, coerência.

Fizeste-me ver a claridade do mundo e como é possível a alegria.
Fizeste-me indestrutível pois contigo não termino em mim próprio". (Ao meu partido, Pablo Neruda)

Quando lembrei-me que Pablo Neruda havia dedicado ao seu partido estas palavras, senti uma igual vontade de expressá-las ao organismo de que hoje faço parte. E assim, uma vez que a vontade fez-se necessidade, devo então dizer, de coração inteiro, que o tempo de partido é enfim chegado.

*Ao Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (Pstu) pelo tempo de aspirância e início de minha nova militância.

domingo, 8 de agosto de 2010

Por que usar óculos durante as manhãs

Acordei às 6h, tomei banho e café e segui sem óculos para o trabalho porque sempre acreditei que são mais simpáticas as pessoas que não usam óculos durante as primeiras horas do dia, ainda que elas sejam míopes, que não cumprimentem as pessoas por não tê-las reconhecido, que percam alguns ônibus por não terem conseguido ler letreiros ou outras coisas parecidas.

Em lá chegando, abri a porta de minha sala e, ainda sem óculos, pus em prática tudo aquilo que um tímido que se preza ensaia diariamente durante seu percurso para que tenha a completa certeza de que as coisas acontecerão de forma natural: um sorriso largo, porém discreto; um bom dia animado; uma caminhada de uma ponta à outra até a geladeira; um copo com água.

Eu estava mandando muito bem, até que uma colega de trabalho me chamou até a porta e comentou com voz de discrição: - Ei. Fomos roubados na noite passada. Serraram a grade, quebraram o vidro da janela, entraram na sala e levaram todos os nossos monitores de LCD. Abri a porta novamente e, em um piscar de olhos, a cena estava exatamente ali, completamente montada.

Os cacos de vidro no chão, as grades retorcidas da janela, as pegadas empoeiradas sobre o estofado da cadeira, aquele vazio de monitores ausentes sobre a bancada, minhas digitais na geladeira, aquela piada que eu e uma amiga fizemos quando nossas bolsas tiveram atraso no depósito, a forma como meus olhos passeavam pelo livro que eu fingia ler enquanto a polícia federal vistoriava o local, tudo levava a crer que eu era a maior suspeita.

Mas era claro que eu não era.

Depois daquele, na Universidade Federal do Maranhão aconteceram tantos outros roubos e mesmo assaltos que muitos de nós talvez só teremos conhecimento quando a administração superior ordenar aos trabalhadores de sua assessoria que o divulguem para então justificar seus planos de segurança armada, catracas eletrônicas e fechamento dos portões que dão acesso às comunidades vizinhas, como o Sá Viana e a Vila Embratel.

Na Ufma, não se fala em concurso público para substituição de uma segurança feita de forma terceirizada que serve para intimidar estudantes em reivindicação e trabalhadores que fazem o trajeto pelo campus porque não podem pagar o valor cobrado pelo transporte público, mas que em contrapartida não consegue arcar nem mesmo com o seu principal, porém absurdo objetivo, o de proteger o patrimônio físico da Universidade.

Eu não queria, mas já há algum tempo voltei a usar óculos às primeiras horas da manhã. Fez-se necessário.
 
Copyright 2009 zine colorido
Convert By NewBloggerTemplates Wordpress by Wpthemesfree